Para quem conhece o Calvin (boneco de banda desenhada), se ele acordasse a meio da noite assustado com a perseguição de um monstro, não seria de admirar. Os sonhos resultam da associação entre conteúdos armazenados na nossa mente. Estes conteúdos vão desfilar nos nossos sonhos de acordo com uma determinada sequência: primeiro são activados os conteúdos mais recentes, ou seja os acontecimentos do próprio dia e só posteriormente os conteúdos mais antigos. A mistura dos conteúdos mais actuais com os do passado dota os nossos sonhos de um certo sentido.
Habitualmente o conteúdo do início de um sonho está relacionado com os nossos últimos pensamentos. Se nos deitarmos a pensar em algo é natural que sonhemos com isso. Esta é a razão que explica a primeira afirmação relativamente ao sonho provável do Calvin. Se ao deitar pensarmos em lugares, pessoas ou situações agradáveis, estas serão provavelmente os primeiros conteúdos dos nossos sonhos, o mesmo acontecendo com os dos nossos filhos.
Os pesadelos são sonhos marcados por um grande terror que levam a pessoa a acordar muito sobressaltada e angustiada. Nas crianças, os pesadelos surgem pela primeira vez entre os 3 e os 6 anos de idade e geralmente têm como personagens monstros e animais enormes. O medo de que o pesadelo se volte a repetir leva frequentemente as crianças a tentarem evitar adormecer.
Os pesadelos estão geralmente associados a situações de ansiedade, tristeza, experiências traumáticas ou de grande stress. Nas crianças a ansiedade aparece frequentemente associada a transições de vida significativas, tais como: entrada na escola, mudança de ciclo, passar a dormir sozinha, morte de um familiar próximo, etc.. Outras situações como a separação dos pais, hospitalizações prolongadas ou simplesmente ver um filme de terror podem conduzir ao aparecimento de pesadelos.
Embora os pesadelos não constituam, por si só, razão para alarme, os pais podem tomar algumas medidas no sentido de ajudarem os filhos a lidar com eles.
Aqui ficam algumas sugestões:
– A primeira medida a tomar é tentar tranquilizar a criança, mostrando-lhe que nada lhe aconteceu, nem acontecerá porque tal como as histórias os pesadelos fazem parte da imaginação.
– Tente mostrar-lhe que tal como nos desenhos animados também nos sonhos só vencem os bons. Sendo ele a personagem boa vencerá todos os monstros que se atravessarem no seu caminho.
– Uma vez que os pesadelos estão geralmente associados a situações de grande ansiedade, tente durante o dia falar com a criança sobre as situações que pensa poderem estar a gerar ansiedade. Desta forma estará a ajudá-la a lidar de uma forma mais eficaz com a situação.
– Institua uma rotina de descontracção e carinho na hora de deitar. A leitura de uma história, sem monstros nem fantasmas pode ser uma boa estratégia para que possa adormecer calma e serenamente.
– Ajude a criança a encontrar um objecto preferido e especial que ela veja como protector. Este objecto deverá ficar ao seu lado na cama de forma a protegê-la contra as personagens más dos seus sonhos.
– Ensine-a desde cedo a dormir sozinha. Se o fizer estará a incutir-lhe confiança e segurança. Se o tempo que o seu filho dorme consigo se prolongar demasiado no tempo ou se for sempre para junto dele até que adormeça, só facilitará o aparecimento de medos.
Na presença da criança não demonstre preocupação relativamente aos pesadelos dela. Se o fizer, a criança sentirá que estes constituem realmente razão de preocupação. A atitude de desdramatização é sem dúvida a mais correcta.
De uma forma geral os pesadelos são frequentes na infância e desaparecem com a idade, não havendo por isso razão para grandes preocupações. No entanto, se estes se tornarem muito frequentes e impedirem de uma forma sistemática que a criança repouse poderá ser importante consultar um especialista.
Por Ricardo João Teixeira, Psicólogo clínico e Psicoterapeuta