Salas de aula a abarrotar. Alunos desinteressados, desatentos e agitados. Docentes cada vez mais sobrecarregados com mais aulas, com mais alunos e com mais burocracia; desgastados e impotentes na imposição de medidas que ponham fim à indisciplina. Falta de assistentes operacionais que vigiem devidamente espaços, onde habitualmente ocorrem conflitos. Pais demasiado atarefados ou preocupados com a sobrevivência, para valorizarem a escola e acompanharem o percurso escolar dos filhos. Eis a escola atual!
Mas afinal de quem será a culpa para a escola estar no estado em que está? Dos alunos? Dos pais? Dos professores? Da forma como o sistema de ensino está concetualizado? Apontaria para a última hipótese. Vejamos cada um dos intervenientes no contexto escolar.
Quem são os alunos que, sem querer generalizar, destroem frequentemente as aulas? Os alunos que foram transitando sem adquirir os conhecimentos necessários para acompanhar o nível crescente de exigência. Quantos são os alunos que, estando a frequentar o 2.º ciclo, não sabem ler nem escrever? Se estão no 2.º ciclo e não adquiriram as competências do 1.º ciclo, então a culpa é dos professores que os passam sem saberem nada? Vejamos, os professores do 1.º ciclo são obrigados a passar todos os alunos do 1.º para o 2.º ano, mesmo que estes não tenham adquirido conhecimentos mínimos, por exemplo, mesmo que não reconheçam as letras. Mas há mais: por vezes, na mesma sala de aulas, o professor tem alunos dos 1.º, 2.º, 3.º e 4.º anos. Mas os professores do 1.º ciclo terão poderes mágicos? Quando o alicerce é frágil…
Serão os pais destes alunos os culpados de tudo? Os filhos não aprendem e eles nem querem saber. Os filhos deixam os professores “à beira da loucura” e eles simplesmente encolhem os ombros e, lá no fundo, bem no fundo, pensam “Os professores que os aturem, pois nós já os aturamos em casa!”. Mas, afinal, quem são os pais destes meninos indisciplinados que, a determinada altura, estão na aula de matemática e tudo lhes parece chinês? São aqueles que, para sustentarem a família, trabalham horas e horas e têm de deixar os filhos entregues a si próprios ou a uma vizinha quando não estão na escola; ou então são aqueles que, não fazendo nada o dia inteiro, desvalorizam completamente o papel da educação no futuro dos filhos. Eles também nunca tiveram jeito para a escola, como é que os filhos haveriam de ter? Não será por acaso que estudos recentes mostram que o baixo aproveitamento escolar e até o abandono escolar dos alunos portugueses não são fenómenos restritos a Portugal. Mesmo quando integrados no sistema educativo do Luxemburgo, Canadá, Reino Unido, Suíça e França, os alunos portugueses apresentam maior insucesso e abandono escolar que os restantes estrangeiros a viver nestes países.
Serão os professores os maiores culpados da situação em que se encontra o sistema educativo atual? Se tivessem a possibilidade de passar algumas horas em salas de aulas completamente a abarrotar, que nem sequer foram projetadas admitindo a hipótese de ter 30 alunos lá dentro… Se conhecessem alguns dos alunos que frequentam essas mesmas aulas… Se sentissem que muito dos alunos não vos ouviam porque se deitaram tardíssimo na noite anterior, ou porque não percebem nada do que lhes é dito, ou, simplesmente, porque não estão habituados a respeitar figuras de autoridade… então seria mais fácil responderem à questão atrás lançada.
Face ao exposto, o que fazer para que a escola possa realmente responder de forma mais eficaz a diferentes necessidades e promova de facto uma maior igualdade? Em primeiro lugar, é urgente uma intervenção precoce, junto de alunos que, nos primeiros anos de escolaridade, apresentem dificuldades. Em segundo lugar, é fundamental que os alunos façam todos os trabalhos escolares no contexto escolar, ainda que isso signifique diminuição do número de disciplinas, mas não de professores. Em muitas famílias portuguesas é utópico pensar que os pais vão estar disponíveis para apoiar e supervisionar a realização de tarefas académicas quando os filhos chegam a casa. Como se trata de uma utopia, há imensas crianças condenadas ao insucesso escolar, logo no início da sua escolaridade.
Por Ricardo João Teixeira, Psicólogo clínico e Psicoterapeuta