Ao contrário do que muitas pessoas pensam, as crianças também sofrem de depressão. A depressão, que sempre pareceu uma perturbação exclusiva dos adultos, hoje em dia afeta cerca de 1-3% das crianças na fase pré-puerperal, e 3-9% dos adolescentes.
Diagnosticar depressão é mais difícil nas crianças, pois os sintomas podem ser confundidos com irritabilidade, birras, mau humor e agressividade. O que diferencia a depressão das tristezas do dia a dia é a intensidade, a persistência e as mudanças nos hábitos normais das atividades da criança. A depressão infantil é uma perturbação do humor capaz de comprometer o desenvolvimento da criança, interferindo no seu processo de maturidade psicossocial.
A etiologia da depressão tem sido estudada por vários autores, contudo ainda não se encontrou uma causa específica que possa justificar quadros de depressão na infância. Entretanto, existem vários fatores de risco associados ao aparecimento da depressão, que podem ser enquadrados em três categorias: biológica, psicológica e social/ambiental.
Entre as causas biológicas, a mais significativa e bem estudada é a hereditariedade (fator genético) para a depressão. Vários estudos tem mostrado altas taxas de depressão nos familiares adultos de crianças ou adolescentes com depressão.
Relativamente aos aspetos psicológicos, sabe-se que situações adversas tais como a separação dos pais, a mudança de escola, a morte de uma pessoa querida ou animal de estimação, podem desencadear quadros depressivos.
No que concerne aos aspetos socioambientais, estima-se que a pobreza, carências económicas e sociais importantes podem estar relacionadas com a depressão.
John Bowlby, figura de referência da teoria da vinculação, contribuiu, com as suas investigações para o estudo das reações da criança perante uma separação materna e associou estes comportamentos como representativos de uma primeira depressão.
O autor defende que a fase considerada mais crítica situa-se entre os 5 meses e os 3 anos de idade.
Numa primeira instância, o bebé atravessa uma fase de protesto no momento de separação (com choro, agitação e manifestações que persistem até dois ou três dias); posteriormente segue-se a fase de desespero (rejeição por parte do bebé em comer, vestir, não aceita nada do meio que o rodeia, assemelhando-se a um estado de grande luto) e, por último, aparece a fase de desvinculação (por exemplo, recusa a presença de enfermeiros, não aceitando os seus cuidados sem a presença da mãe). Este tipo de depressão infantil pode ocorrer muito precocemente e está relacionada com a ausência dos cuidados maternos.
Apesar da depressão poder aparecer em qualquer idade, o risco de desenvolver depressão aumenta significativamente com a puberdade. A prevalência de depressão nos adolescentes chega a 20-25%, de acordo com a Academia Americana de Psiquiatria da Infância e Adolescência.
Para o diagnóstico de depressão infantil é importante que os sintomas estejam presentes por, pelo menos, duas semanas e que representem uma mudança significativa do funcionamento da criança com pelo menos um dos sintomas:
1. Humor depressivo durante a maior parte do dia (sentimentos de tristeza, vazio, choro);
2. Marcada diminuição do prazer ou do interesse em várias atividades;
3. Perda ou ganho significativo de peso;
4. Insónia ou hipersónia quase todos os dias;
5. Agitação ou lentificação psicomotora;
6. Cansaço ou perda de energia quase todos os dias;
7. Sentimento de vazio ou culpa inapropriada;
8. Diminuição da capacidade de pensar e de se concentrar quase todos os dias;
9. Pensamentos recorrentes de morte ou ideação de acabar com a vida.
Com crianças, o tratamento da depressão pode incluir psicoterapia, isoladamente, ou em combinação com medicação antidepressiva. Embora as opiniões variem sobre qual o melhor tratamento da depressão, um crescente corpo de evidências indica que a melhor abordagem para a maioria das crianças é uma combinação de ambos. O plano de tratamento deve ser adaptado à gravidade dos sintomas da criança, e à forma como estes afetam o seu desenvolvimento. Para tratamento da depressão, a terapia cognitivo-comportamental (TCC) pode ser especialmente eficaz. Crianças que estão deprimidas muitas vezes têm uma visão negativa de si mesmas. Com a TCC, as crianças aprendem a desenvolver uma perspetiva mais positiva, o que pode ajudar a aliviar a depressão. É sempre útil as famílias estarem igualmente envolvidas na terapia. A detecção precoce e tratamento da depressão é importante em qualquer idade, sendo o apoio da família essencial.
*texto do Dr. Ricardo João Teixeira, originalmente publicado no site Mãe-Me-Quer, maio de 2014: Depressão Infantil